
E se você acordasse dentro daquela fanfic embaraçosa que escreveu na adolescência: cheia de ideias exageradas, personagens idealizados e decisões que hoje causam vergonha alheia? Tensei Akujo no Kuro Rekishi (The Dark History of the Reincarnated Villainess) parte exatamente dessa premissa: um isekai onde a fantasia não é viver grandes aventuras, mas sobreviver às consequências das próprias escolhas criativas.
Em Tenkuro, o maior inimigo da protagonista é o passado que ela mesma escreveu. Para Konoha, esse pesadelo vai além: ela não é a heroína, mas a vilã detestável de sua própria “história sombria”: Iana Magnolia. E ela precisa usar cada detalhe vergonhoso que criou para evitar as diversas death flags que ela mesma planejou.
Adaptado do mangá de Touka Akiharu pelo Studio Deen, o anime transita entre a comédia romântica shoujo e o isekai de vilã, dois territórios já bastante explorados, com uma pitada de autocrítica. E isso pesa tanto a favor quanto contra a obra. Embarca comigo?
Ficha técnica: Tensei Akujo no Kuro Rekishi
Anime: Tensei Akujo no Kuro Rekishi 「転生悪女の黒歴史」
Gênero: Comédia e Romance
Número de Episódios: 12
Estreia: 9 de outubro de 2025
Estúdio: Studio Deen (Fate/Stay Night, Vampire Knight, Fruits Basket, Rurouni Kenshin, Hakuouki, Full Moon wo Sagashite, Rozen Maiden (2013), Touka Gettan)
Adaptação: mangá de Touka Akiharu
Satou Konoha passou anos escrevendo uma fantasia romântica cheia de clichês e reviravoltas dramáticas. Ao acordar no mundo de sua antiga fanfic adolescente, ela assume o papel de Iana Magnolia, a vilã destinada a um fim trágico, e precisa evitar as death flags que ela mesma criou. Conhecer cada detalhe do enredo deixa de ser um conforto e se torna uma questão de sobrevivência. O problema é que nem tudo segue exatamente o roteiro original: novos personagens surgem, eventos mudam e o caos narrativo cresce conforme a história avança.
A arte de sobreviver ao próprio “cringe”
Embora a premissa de “reencarnação como vilã” já seja um subgênero saturado, Tensei Akujo no Kuro Rekishi tenta se diferenciar ao focar no arrependimento da autora sobre suas escolhas criativas do passado.
O episódio de estreia abraça o clichê clássico do “Truck-kun” enviando a protagonista para o mundo de fantasia sem vergonha alguma. A obra parece consciente do quanto isso já foi usado e tenta brincar com a ideia, quase como uma paródia. Funciona no começo, mas já deixa sinais de diálogos rasos e situações surreais demais. Qualquer falta de lógica não é mera coincidência.
O grande charme (e também o maior desafio) de Tenkuro é a constante sensação de vergonha alheia. Konoha, ou melhor, Iana Magnolia, vive em um eterno conflito entre sobreviver e esconder o fato de que aquele mundo é fruto de suas fantasias juvenis mais extravagantes. O resultado é uma obra que sabe rir de si mesma, mas que nem sempre encontra o equilíbrio certo entre as doses de humor, desenvolvimento e ritmo.
Personagens presos ao script
Conforme novos personagens surgem e as death flags se acumulam, fica evidente um dos problemas centrais da obra: a falta de profundidade emocional do elenco. Muitos conflitos nascem de mal-entendidos superficiais, criados mais para empurrar o roteiro do que para revelar algo novo. A sensação constante é de que todos ainda estão presos às versões imaturas do texto original, como se nunca tivessem passado da fase de rascunho.
Konoha — não a Iana, a heroína da história — é o maior símbolo disso. Sua fragilidade extrema, onde um suspiro mais alto já é motivo para mobilizar uma equipe médica inteira, faz dela mais uma personagem decorativa do que qualquer outra coisa. Ginoford sofre do mesmo mal: sua personalidade raramente evolui além do papel que lhe foi atribuído no “script”. Até para personagens que, teoricamente, seguem um roteiro pré-definido, o exagero pesa.
Nesse cenário, Sol e Cheneau acabam sendo pequenas exceções. São eles que, em alguns momentos, ensaiam atitudes inesperadas e fogem levemente do padrão previsível. Ainda assim, essas quebras nunca são completas. É como se o anime tivesse medo de deixar seus personagens escaparem totalmente do controle da autora.
Suspeita até que se prove o contrário?
⚠️ >> Alerta de spoiler!
O excesso de mal-entendidos que colocam Iana no centro das suspeitas, quase como se respirar fosse motivo suficiente para um julgamento, cansa rápido. A repetição dessa dinâmica reforça a impressão de que falta personalidade aos personagens criados por Konoha. Eles reagem sempre da forma mais óbvia: previsíveis demais ou simplesmente confusos, sem um motivo convincente.
O anime até acerta quando assume o absurdo e se apoia na comédia autoconsciente, mas tropeça ao tentar tratar com seriedade intrigas políticas ou ameaças de morte. O tom cômico constante da protagonista dilui qualquer sensação de perigo, fazendo com que cenas que deveriam gerar tensão percam completamente o peso.
⚠️ >> Alerta de spoiler!
A introdução de um personagem que aparenta ser “o criador da história” é, conceitualmente, uma das ideias mais interessantes do anime. No entanto, se Konoha/Iana é a autora desse mundo, quem exatamente é essa figura misteriosa? Como ele conhece o roteiro? E, mais importante: por que ele parece ter poder para manipular os acontecimentos? O anime levanta perguntas instigantes, mas não parece saber exatamente o que fazer com elas.
Ritmo em forma de esboço sem revisão final
Tensei Akujo no Kuro Rekishi acaba se encaixando em uma tendência cada vez mais comum nos lançamentos recentes: muitos episódios dedicados à contextualização e pouquíssimo espaço para desenvolver os conflitos que importam. Quando a história finalmente começa a engrenar, já estamos nos episódios finais — e tudo passa a acontecer rápido demais.
O resultado é uma conclusão apressada, cheia de eventos jogados em sequência, deixando mais incertezas do que resoluções. Fica aquela sensação incômoda de que os episódios iniciais foram apenas uma longa introdução e que o “anime de verdade” começou tarde demais.
Em casos assim, talvez fosse melhor apostar em mais episódios ou repensar a adaptação, em vez de entregar uma história que termina antes de amadurecer. Parece que o número 12 se tornou um padrão entre os animes, mas quem deve ditar o volume é o contexto. E cada roteiro tem o seu. Em vários momentos, Tenkuro parece preso a um primeiro rascunho que nunca chega à revisão final.
Veredito: entre o humor consciente e um rascunho constrangedor

Em teoria, Tensei Akujo no Kuro Rekishi tem todos os elementos para conduzir uma jornada leve e autoconsciente: uma protagonista que conhece o próprio roteiro, um mundo de fantasia moldado por exageros adolescentes e a promessa de rir das próprias extravagâncias. Na prática, porém, o anime se perde na repetição. As reações exageradas de vergonha de Iana e a constante hesitação da protagonista — curiosamente passiva, mesmo sendo a heroína da história — acabam desgastando a experiência ao longo dos episódios.
Pode ser que esse excesso seja parte da proposta: a obra parece querer escancarar o quão caótica, mal pensada e emocionalmente imatura era a escrita original de Konoha. O problema é que nem sempre o anime consegue transformar esse conceito em evolução narrativa.
Por que pode valer a pena dar uma chance?
- Autocrítica: se você já escreveu algo e sentiu vergonha anos depois, vai se identificar com a Konoha (Iana).
- Clichês de sobra: eles existem e são praticamente protagonistas à parte ao lado de Iana e companhia.
- Comédia absurda: não é um estilo para todos, mas pode ser o tipo de humor na dose certa para alguns com todos os seus exageros e imperfeições.
Tensei Akujo no Kuro Rekishi transita entre o divertido e o genérico, com boas ideias que nem sempre encontram a melhor execução e algumas doses forçadas de comédia. Não é uma obra que se sustenta pela profundidade, mas pode agradar quem aceita rir do “cringe”, do exagero e da sensação constante de que essa história precisava de mais uma revisão antes de virar anime.
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E você? Teria coragem de viver dentro da sua própria “história mal escrita” ou faria de tudo para fugir antes do primeiro capítulo terminar? ˆ-ˆv